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Quando eu morei em Pouso Alegre (MG), de 1998 até 2005, eu tinha o costume de explorar a região pedalando. Aliás, foi nessa época que eu comecei a pedalar com mais “afinco”, por assim dizer. Tudo bem que era uma exploração superficial, eu nem tinha recursos para fazer diferente, GPS era muito caro, ainda não existia o Google Earth, mas de qualquer forma isso me fez conhecer bem os caminhos em todas as direções na região. Eu acabei conhecendo muitas localidades num raio de 50 Km, tais como : Borda da Mata, Estiva, Congonhal, São Sebastião da Bela Vista, entre outras, cidades, vilarejos, povoados, afins e similares.

Por isso, assim que me mudei para São Paulo, em 2005, eu pensei que pudesse explorar a metrópole assim como fazia no interior. E, com efeito, foi o que eu fiz. Posso dizer sem  medo de errar que conheci lugares na grande SP que muito paulistano da gema não conhece. Por exemplo, já ouviu falar na Ilha do Bororé ? Fica na represa Billings e na verdade não é uma ilha, é uma península, mas como tem as balsas (!) para chegar e para sair do outro lado dá a impressão de ilha… O trecho mais novo do Rodoanel Mário Covas passa bem no meio dela. Enfim, só para dar mais um exemplo, sabia que tem uma aldeia indígena ali aos pés do Pico do Jaraguá ? Pois é… E por falar no Pico, já subiu lá ? Minha esposa que é paulistana não conhece esses lugares.

A balsa da Billings, gratuita e 24 horas !

A espera pela balsa, na divisa com São Bernardo do Campo, em direção à Ilha do Bororé.  Achei uma matéria legal sobre a ilha na revista Piauí : http://www.saudedafamilia.org/noticiario/revista_piaui.pdf

A vista do Pico do Jaraguá. Acima com a bike e abaixo sem.

Mas esse período de exploração não durou muito, menos de um ano. Eu me lembro que saía de casa, pegava o maior trânsito na Rebouças, depois na ponte Eusébio Matoso, pegava a Raposo Tavares, ia até o Rodoanel e voltava pela Bandeirantes, desembocando na marginal. Às vezes, subia na calçada para fugir dos carros… Hoje eu penso : Quanta loucura !! Na época eu encarava como um desafio, e o desconforto de enfrentar o trânsito era  compensado pela sensação boa de desbravador, conquistador, tipo “Que legal conhecer Sampa pedalando” ! Até que, um tempo depois, essa sensação já não era maior do que o desconforto. Comecei a pensar duas vezes antes de ir para uma rodovia, ou mesmo para ir até a Serra da Cantareira pela Zona Norte, como já tinha feito várias vezes, e por caminhos diferentes. Todo dia tinha algum episódio, uma fechada de um carro, de um ônibus. Uma vez a fechada foi tão violenta que eu tive que sair da pista e ainda por cima perdi meus óculos, que foram atropelados por um caminhão que passava…! Ainda bem que eu mesmo nunca sofri nenhum acidente.

Era isso, o romantismo do desbravamento começou a dar lugar ao temor do trânsito.  Foi quando eu comecei a tristemente perceber que o trânsito de São Paulo não é brinquedo. Foi quando comecei a ver com meus próprios olhos o que acontece com as pessoas ao volante de um carro. Lembrei-me de um antigo desenho de Walt Disney, do Pateta, mais especificamente, onde a estória tinha um quê de Dr. Jekyll e Mr. Hyde (O Médico e o Monstro),  o personagem do Pateta se transformava em monstro quando sentava no volante do seu carro. Era o Sr. Andante versus o Sr.Volante (no original Mr. Walker x Mr. Wheeler). Pois esse desenho (http://www.youtube.com/watch?v=y_i5jwXRAbE), na minha opinião,apesar de ser apenas entretenimento, é exatamente o que acontece. As pessoas se sentem poderosas atrás daquelas toneladas de metal e fazem coisas que, tenho certeza, não fariam enquanto pedestres. Não há respeito por nada nem por ninguém. Um exemplo que eu vi ano passado quando andava pela R. Arthur de Azevedo, em Pinheiros : o carro avançou o sinal vermelho, quase atropelou um pedestre (na faixa !!!) e ainda buzinou como se o pedestre estivesse errado !… Outro dia na rodovia Pres. Dutra, num pedágio, o carro estava dando ré no meio da pista ! Acha incrível ? Pois não ache, é verdade, é o monstro que existe dentro de nós. Digo nós, porque confesso : já fiquei estressado no trânsito a ponto de cometer excessos. Já me envolvi em acidentes por minha única e exclusiva culpa, dos quais tenho vergonha de falar, apesar de nunca ter me machucado… Mea culpa, sim, admito… Mas hoje o que mais me estressa no trânsito é a inépcia e a imprudência dos outros. As pessoas só se preocupam consigo mesmas, e além disso, são incompetentes na tarefa de dirigir. Não sei se compram a carteira, ou o coisa que o valha. E o desrespeito à sinalização ? Tem exemplos próximos, como o de um amigo super gente boa, mas que acha que uma conversão proibida de vez em quando não faz mal. Tem os distantes, mas que vejo sempre, como os motoqueiros que entram na contra mão para furar a fila do semáforo… Aliás, já vi carro fazendo isso, aqui na rua de casa !

O resultado disso tudo foi que eu parei de pedalar na área urbana de São Paulo, a não ser nas idas ao Ibirapuera, já que não dá para ficar sem pedalar, nem que seja um treino.  Rodovias, estradas, avenidas, tô fora….! Daí eu vejo essas campanhas todas : vá de bike, não vá de carro, e etc e tal, e os amigos que sabem que eu sou ciclista me perguntam o que eu acho, se sou contra ou a favor. Surpreendentemente, apesar de eu ser totalmente a favor da bike, eu sou contra pedalar em São Paulo. Na minha opinião, não é viável, é perigoso, respira-se muita poluição de escapamento, e além de tudo não dá prazer, só stress. É um risco desnecessário.

Para se poder pedalar na cidade de São Paulo, teria que haver mais ciclovias, ou então usar caminhos alternativos, mas é difícil, nem sempre dá para escapar das grandes avenidas. Não dá para disputar com os carros as já sobrecarregadas vias públicas, e esse papo de que o carro tem que dar uma distância de 1,5 m ao ultrapassar o ciclista é pura utopia, apesar de estar lá, no código de trânsito. Se os motoristas não respeitam o básico, que é o sinal vermelho, conversões proibidas, que dirá as bikes e seus condutores !!!

O que eu faço hoje em dia, para poder pedalar com segurança e ter prazer de fazer uma atividade física ao ar livre, é pegar o carro, enfrentar o trânsito e dirigir até uma cidade próxima, pedalar um trecho circular e voltar para casa dirigindo. Não é que eu não respeite as campanhas que incentivam o uso da bicicleta, é que eu não concordo que seja possível conviver com a porção Mr. Wheeler  das pessoas, que definitivamente está levando a melhor sobre a porção Mr. Walker.

Assim, já fui para Mairiporã (paraíso do MTB), Atibaia, Jarinu, Santa Isabel, Guararema, Jacareí, Nazaré Paulista, Santa Branca, Salesópolis, Paraibuna, Jambeiro, São Roque, Alumínio, Igaratá, Porto Feliz, Itu, Socorro, Indaiatuba, Itupeva, Jundiaí, Paranapiacaba, Extrema, Vargem,  e outras.  E, diga-se de passagem, aliás, essas trilhas são bem mais tranquilas, mais bonitas, o oxigênio muito mais abundante, e há a chance de conhecer esses lugares que acho que nunca iria se não fosse para pedalar !

Algumas fotos de trilhas que já fiz nas cidades citadas acima :

A represa de Itupararanga, que fornece energia para a CBA (Companhia Brasileira de Alumínio) em Alumínio, perto de Sorocaba.

Um singletrack pedregoso em Itu. O céu azul me fez decidir por colocar a foto.

O mirante de Paranapiacaba, distrito de Santo André. À esquerda pode-se ver a linha de trem, e ao fundo, Cubatão com neblina.

Rampa de voo em Extrema (MG).

Eu, por mim mesmo, numa dessas trilhas da vida… E usando os óculos que foram “atropelados” pelo caminhão…

Concluindo, no trânsito somos todos pedestres ! Essa frase pode parecer batida, careta, mas, no fundo, é a pura verdade. E se todos pensarem assim quem sabe o Mr. Walker tem alguma chance de vencer a parada…!